O Cerrado é nossa caixa d’água

Falam o tempo todo de Amazônia, a novela Pantanal colocou o bioma nos holofotes, a Mata Atlântica também é sempre citada, muitos de nós moramos nela… mas e o Cerrado?

Você sabia que o Cerrado é a mais rica savana do mundo em biodiversidade? Que é o berço das águas brasileiras? Vamos entender o porquê.

*Esse texto foi baseado no podcast Vozes do Planeta da jornalista Paulina Chamorro no episódio 214, com o biólogo, pesquisador e professor da Universidade de Brasília, Reuber Brandão.

Caixa D’água

Você já ouviu a expressão: “o cerrado é a caixa d’água brasileira”?

Isso acontece porque, diferente de outras savanas pelo mundo, chove muito na região. Em algumas partes do bioma chove o mesmo tanto que em algumas regiões amazônicas. Essa chuva que cai no Cerrado é incorporada ao solo, o solo retém a água, e essa água é refletida numa quantidade enorme de nascentes que alimentam as principais bacias brasileiras.

O Cerrado tem uma posição estratégica para conservação de recursos hídricos utilizados na agricultura, nas hidrelétricas e no abastecimento de cidades. É onde fica nosso estoque de água. O Cerrado é fundamental até para a geração de energia do país.

São dois biomas interconectados: Amazônia e Cerrado. A Amazônia forma os famosos rios voadores, que são vapores d’água gerados pelas árvores que viram as chuvas e essas chuvas atravessam o Cerrado – que armazena essa água. Se a Amazônia “sumir” a quantidade de chuva vai ser reduzida abruptamente e isso vai representar uma verdadeira crise no abastecimento de água no país, além de todas as perdas de biodiversidade.

Já perdemos 45% do bioma

O Brasil não é um país mega diverso só por causa da Amazônia, mas sim por causa dos seis biomas (Amazônia, Mata Atlântica, Pantanal, Cerrado, Caatinga e Pampas) – todos tem um papel fundamental para a biodiversidade brasileira.

A única savana úmida do mundo é também a mais biodiversa e se a sociedade brasileira não tiver capacidade de proteger essa savana, ela pode ser perdida. Com essa perda, todos os frutos, a fauna, os processos ecológicos seriam perdidos e junto com eles, a nossa água. Já estamos vendo muitas perdas nas bacias.

Do velcro a cura de doenças

O país também poderia se tornar uma potência em biotecnologia só por conta das riquezas do Cerrado.

Num belo exemplo de biomimética, que é a área da ciência que estuda os princípios da natureza, temos o caso do Velcro®. Ele foi descoberto através de um estudo do carrapicho. Sim, o Velcro que usamos na carteira, na bolsa… Um engenheiro suíço ficou cheio de carrapicho, ou bardana, preso em suas roupas e resolveu estudar a planta. Sete anos depois veio com a descoberta de um material que para ele parecia VELudo e CROchet = Velcro (essa palavra na verdade se refere à marca registrada). Hoje temos Velcro até em roupa de astronauta.

Remédios, cosméticos, produtos biotecnológicos, produtos para nanotecnologia, novos alimentos e até novas commodities podem surgir a partir de estudos no Cerrado.

Existem proteínas vindas de serpentes cuja comercialização para a indústria farmacêutica gera uma quantidade enorme de recursos, com apenas uma molécula.

Uma pesquisadora da UNB, a professora Márcia Mortari, patenteou uma molécula encontrada na peçonha da vespa, já que a mesma tem um papel anticonvulsivo – e pode ser usada para tratar Parkinson.

Precisamos valorizar a biodiversidade ao mesmo tempo que buscamos riquezas por meio dela.

Podemos regenerar o Cerrado?

Os custos para um processo de regeneração são bastante altos e devem ser colocados na balança sempre que falamos nesse tema. Uma área extremamente degradada tem um custo muito alto. Hoje  nos resta apenas 10% da Mata Atlântica e por isso há muitos esforços para regenerar o bioma – foi o grande palco da ocupação territorial brasileira: café, cana… Hoje restou muito pouco e por isso há tantos esforços para regenerá-lo.

No Cerrado “ainda” temos cerca de metade, só que pulverizado entre os estados, num processo de ocupação bastante agressivo, por conta da expansão agrícola. É fundamental transformar em áreas de proteção. Os proprietários de terra que protegem o Cerrado precisam ter algum tipo de compensação por ajudar na proteção do bioma, por prestar serviços ambientais, já que é custoso ser um proprietário de terra que preserva áreas.

Temos que incentivar que esses proprietários a pressionarem os governos por compensação por serviços ecossistêmicos já que esse tipo de recompensação beneficiaria toda a sociedade.

As belezas do Cerrado

Unidades de Conservação, parques estaduais… o ecoturismo é um grande aliado na conservação dos biomas. O Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, por exemplo, (eu e a Mariana visitamos e nos apaixonamos. Nessa foto ela está com o Beto) é uma bela ilustração de como podemos todos nos beneficiar da conservação do bioma.

Tem pesquisadores que sugerem que o ser humano, ao estar em paisagem de savana, tem uma recompensa emocional e cognitiva que é diferente daquela que temos em ambiente florestal, por exemplo. Algumas pessoas podem se sentir claustrofóbicas em florestas, já o oposto ocorre no Cerrado onde há grandes horizontes, etc. É fato que nos sentimos diferentes na Chapada dos Veadeiros. É um ambiente realmente mágico.

Outras unidades de conservação tão lindas quanto e talvez menos conhecidas no Cerrado são: Jalapão, Serra da Canastra, Chapada dos Guimarães, Chapada das Mesas. Todo brasileiro deveria conhecer esses paraísos nacionais!

O caso Chapada dos Veadeiros

Um lugar com cachoeiras lindíssimas, belas paisagens e uma cultura local muito rica, não é o parque mais visitado do país por falta de estrutura, mas é um parque que movimenta cerca de 90 milhões de reais por ano.

Existe um projeto na Câmara dos Deputados, que visa reduzir o tamanho do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros em 73%. A proposta é de autoria do deputado federal Delegado Waldir (PSL-GO), que alega que o tamanho atual do parque “prejudica os agricultores da região”.

Pesquisadores, jornalistas, ambientalistas, frequentadores do parque entendem que a proposta não faz nenhum sentido. Empresários do ramo hoteleiro, dos transportes, da gastronomia são unânimes em dizer que o que fez crescer a região foi a exuberante beleza do local, através da conservação e o ecoturismo. Prefeitos de regiões vizinhas querem replicar o que Alto Paraíso, por exemplo, tem sido bem-sucedido em realizar em fluxo de turistas, pesquisadores, novos moradores…

Existe um discurso anti-meio-ambiente, que beneficia dois ou três seres que possam estar interessados na ocupação da região que não a conserve. A conservação trouxe melhorias de vida para todos da região.

O que a gente pode fazer?

Podemos ajudar a Chapada replicando nas nossas redes sociais – e onde pudermos – o material de divulgação a favor da conservação da Chapada, chamado Nem Um Hectare a Menos. #NemUmHectareaMenos

Visitar os parques nacionais, divulgar, votar em políticos com a pauta ambiental alinhada. E pressionar, sempre.

Também há o documentário Sertão Velho Cerrado, de graça no youtube.

Saiba mais sobre o caso:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Qual testamos?

Ouça o episódio sobre o Cerrado no Vozes do Planeta na íntegra aqui:

Spotify

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